quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Encontros de Cura

Quase todas as quarta-feiras, depois de um dos meus atendimentos, encontro um amigo, que aqui chamarei de Novalis (outra grande história!), muito coligado com a energia de cura. É um sócioterapeuta com uma história de vida facinante que nos prende pelos seus interessantíssimos encontros - que não consigo acreditar que sejam fortuitos - com pessoas das mais diferentes idades, posições socio-econômicas, crenças, e nos momentos e locais mais remotos deste planeta terra - um exemplo seria o antigo mosteiro de Saint Michel, na costa norte da França! Que história, que encontro..... pena que não posso revelá-la aqui!
Durante os cafés e bolos de aipim com côco (hum!), falamos sobre diversos assuntos, mas principalmente, e é o que torna este encontro mais delicioso e instrutivo, é que os assuntos da alma são os que mais nos facinam e nos prendem. Não pelo seu conteúdo esotérico ou hermético, mas pela verdade que consigo absorver deste momento - deste encontro. Uma verdade que contém a importância dos ''encontros" na nossa vida.

Acho que todos sabem o que a palavra 'encontro' significa. No dicionário, um de seus significados aparece como "ato de encontrar ou encontrar-se". Para mim esta definição seria muito normal se não fosse a minha própria experiência de encontrar e encontrar-me nos inúmeros e infindáveis encontros que já experienciei e espero continuar experienciando......
Penso que podemos ter muitos encontros durante a vida, mas poucos tem o valor e a essência do verdadeiro encontro. E isso deve-se apenas a um detalhe - e que por ser detalhe não o torna menos importante, ao contrário, torna-o mais precioso e delicado - que é a vivência do presente. Podemos nos encontrar com um vizinho, com um conhecido, com um cachorro ou mesmo com um vento forte que de repente traz consigo uma sugeirinha para dentro dos nosso olhos. Sim, podemos. E daí? E daí que podemos deixá-los passar..... e aí o encontro foi-se. A essência do momento se desfez pois nós estavamos lá nos problemas do nosso trabalho ou de nosso relacinamento, nos conflitos de nossa vida e o vizinho estava ali, bem a nossa frente com um enorme presente. O cachorro estava ali, com um enorme abanar de rabos e olhos brilhantes mostrando-nos o quão feliz ele esta em ter-nos ali - mesmo que durante aqueles milésimos de segundos....... E nós, sem aceitarmos esse presente continuamos a carregar nossas bagagem de passado e futuro e de tristezas incomprendidas......

Acho que encontros são presentes..... presentes do presente! Algumas vezes consigo sentir isso durante os meus atendimentos e enquanto caminho em qualquer lugar cheio de pessoas e situações possíveis. As vezes consigo perceber os momentos em que verdadeiros encontros acontecem, as vezes não....... e isso depende do quão eu estou aberta aquele momento, aquela possibilidade de tocar e ser tocada. De ser preenchida por todas as informações, sentimentos, aromas, cores e barulhos que o meio me oferece e que a pessoa me oferta durante uns dos momentos mais difíceis para ela........o de entregar-se..... o de permitir-se ser tocada.....

Vejo que o deixar-se tocar pelo outro, por algo ou pelo momento é a porta que permite que um encontro aconteça, e para deixar-se tocar é preciso que o momento seja percebido, que a pessoa seja percebida na sua mais pura forma de estar ali .....

Para perceber temos que nos despir daquilo que foi - e do que fomos - e daquilo que pode ser - e queremos que seja. Caso contrário o passado e o futuro torna-se-ão uma porta intransponível e passaremos então a nos relacionar com o outro como uma ilusão, coberta com aquilo que um dia aprendemos ou com aquilo que desejamos ........... e a pessoa? E o presente?E o encontro? Vão embora....

O instante em que percebemos o encontro é aquele em que dois corações se encontram........, não há fala, não há gestos, não há pensamentos, nem sentimentos............ é como se o tempo parasse......... a respiração parasse........ o mundo parasse por pequenos-eternos segundos. Neste instante não há nada, não há Eu, nem o Outro, nem você, nem ele, nem ali, nem aqui, nem passado nem futuro - apenas o momento. Momento sublime, onde, não tendo nada acontecido, é sentido que tudo mudou.

Momentos sutis como esse aparecem a todo instante para nós, mas sinto que temos que nos deixar levar por ele. Temos que treinar isso todos os dias! Deixar que o outro seja o espelho do nosso aprendizado, da nossa possibilidade de crescer e de realizarmos o nosso encontro. Que o outro seja a possibilidade de nos encontrarmos com a parte de nós que é aquele "momento do encontro" - o momento silêncioso e transformador - onde nada acontece porém nada continua igual ao que era.

Esse é o verdadeiro encontro. Encontra-se consigo mesmo, através de tudo de de todos. E deste momento em diante continuar o caminho até o próximo encontro, até o próximo abanar de rabo de um cachorro ou da entrada de um cisco nos olhos trazidos pelo sopro do vento ......


Quem sabe o vento não veio nos ajudar a mudar nosso olhar para as coisas da vida? Quem sabe?







Obs.:Desejo a todos aqueles que são meus encontros que a vida de vocês torne cada momento presente, um presente de muitos encontros!


Imagem: Pearl of Searching. From “His Country” series. 1924 - Nicholas Roerich



terça-feira, 4 de novembro de 2008

Reflexões sobre o Desapego


Ultimamente alguns acontecimentos têm proporcionado aprendizados um pouco doloridos para uma parte de mim. É um aprendizado difícil de ser colocado em palavras, pois sinto que as palavras são incapazes de demonstrar, de forma real e profunda, o que muitas vezes acontece "dentro" de mim. Mas vou tentar revelar um dos lados desta experiência.......


No post anterior disse que um dia falaria sobre o Apego/Desapego. Pois é, parece que algo dentro de mim já estava transformando-se com as vivências em torno desta, como direi..... desta palavra? Experiência? Sentimento? É... talvez sentimento. Sentimento de Apego.

Certo dia, quando eu e meu marido retornávamos de uma viagem com um casal de amigos, eu conversava com minha amiga sobre algumas experiências minhas em um Monastério e de repente a palavra desapego apareceu em nossa conversa. Eu falava sobre a experiência de monges e monjas em Monastérios e como era importante, para aquela escolha de vida, a vivência diária do desapego. Naquele mesmo momento senti internamente que estava adentrando em uma "zona perigosa", especialmente por compreender a dificuldade que temos com esse sentimento.

Durante o relato sobre a vivência destes monges e monjas no interior de um Monastério, minha amiga perguntou-me se essas pessoas podiam manter contato com seus familiares e amigos que estavam "do lado de fora". Minha resposta, baseada em algumas leituras e experiências naquele local, foi a de que aquela vida era uma escolha por uma vivência interior (conhecimento de Si) e que o desapego em relação à vinculos afetivos e individuais era base do trabalho destes seres. Pois bem, nesse momento senti aquele frio na barriga. Senti que talvez não conseguisse explicar, em profundidade, aquela realidade vivida por eles - muito menos aquilo que eu tinha vivenciado estando naquele lugar tão especial.

Lembro que minha amiga comentou que achava aquilo muito extremista e, assim que fez este comentário, meu marido também pronunciou-se concordando com este ponto de vista. Ela disse algo relacionado a não estar junto com as pessoas queridas, ajudando-as quando precisavam...... enfim.... a última coisa que me lembro foi do meu amigo cortanto nossa conversa, proponto que trocassemos de assunto, pois aquele era muito "pesado".

Bem, é aqui que gostaria de chegar. Lembra-se quando, no post anterior, eu pedi que você pensasse sobre a palavra Apego? Sentisse o que ela essa palavra o(a) fazia sentir? Pois bem..... acho que meu amigo conseguiu ser um exemplo do que esta palavra normalmente desencadeia nas pessoas..... sentimento de algo "Pesado", algo que incomoda, que nos faz sentir medo, desconforto. Muito desconforto..... Sentimento de "aperto no peito".

Nem preciso dizer que a conversa parou por ali e não tivemos mais oportunidade de continuá-la. Mas tudo bem, pois posso dizer que aquilo foi um momento muito significativo e de um valor inestimável para meu aprendizado. Percebi que talvez, essa seja uma das nossas principais dificuldades durante a vida. Desapegar-se, desapegarmo-nos.

Aqui, não falo somente em relação às pessoas, pois esses apegos são uma das formas de vínculos que fazemos para nos sentirmos "inteiros" à medida que o outro parece nos completar de diversas formas. Falo também de idéias, de conceitos, de paradigmas, de vontades e desejos..... de "querer" e "não querer" e de valores.

Posso dizer, e acredito que você concordará comigo, que são as idéias, os valores, os paradigmas e nossos desejos que nos impulsionam (ou não) para frente, certo? Pois bem, vejamos: você alguma vez já viveu uma situação em que não conseguia mais ver saída alguma? Que não sabia mais o que fazer para que aquilo se resolvesse? Pensou, pensou e..... nada? Eu também....... e muitas vezes! E vivo isso diariamente.

É aí que entra o Desapego. Quando pensamos e pensamos o que poderiamos fazer para "sair" do problema e não conseguimos resultado algum, o que ocorre na verdade é que estamos procurando a "mesma saída" que usamos para sair do último problema, e do penúltimo e do antepenúltimo..... Sabe o porquê? Apego. Apego àquela forma de reagir, de sentir, de ver o mundo e as situações, de fazer algo sempre igual....

Essa relação que temos com o apego é simples de compreender se pensarmos para quê serve este sentimento. Ao nos apegarmos à algo, à alguém ou alguma idéia ou valor, fazemos isso em função da segurança que sentimos durante este ato. É mais confortável ficar naquilo que é conhecido, naquilo que sabemos onde vai dar, do que Criar algo novo, pois Criar algo novo significa desvincularmo-nos, desapegarmo-nos daquilo que faz sentido e principalmente das expectativas (benditas expectativas!!).....
Isso não significa que tenhamos que desvalorizar nossas experiências passadas, mas apenas compreender que elas faziam parte de um contexto diferente daquele que hoje nos encontramos. Podemos agradecê-las, pois foi através delas que chegamos onde estamos Aqui e Agora, e então as deixarmos ir...... - desapegarmo-nos. Então, olhamos para frente, olhamos para o Novo contexto e Sentimos o que de nós está sendo exigido naquele Único instante - Criarmos algo novo.

O mesmo podemos dizer do apego às pessoas. Quando falo em desapergarmo-nos de alguém, não significa deixar de a querer bem, de respeitá-la ou de amá-la. Mas desapergarmo-nos daquilo que ela foi ontem ou a um segundo atrás. Desapergarmo-nos da idéia que fazemos dela, deixá-la livre para ser o que de melhor possa ser, isso sim é amá-la e respeitá-la. O mesmo exercício podemos fazer conosco. Desapegarmo-nos da idéia de quem somos...... do que acreditamos que somos, pois se nos apegamos à quem somos agora, como crescer? Como mudar e evoluir? E como deixar o outro crescer para tornar-se o seu maior potencial?

Nós podemos comprender o desapego de duas maneiras, como forma de desamor ou egoísmo, ou como uma vivência libertadora, libertadora de Si e do outro. Uma vivência de desapegarmo-nos das expectativas que temos em relação ao outro e de nós mesmos. Desapegarmo-nos daquilo que achamos que o outro é e daquilo que acreditamos (fielmente!) que somos.
Como você quer encarar o desapego? Como forma de egoísmo e falta de amor e vivê-lo como algo "pesado" e que "aperta o peito" e que traz sofrimento? Ou prefere compredê-lo e vivenciá-lo como uma ferramente de amadurecimento interior e potencialmente curativa? Bem, só cabe a cada um de nós decidir........ eu já fiz a minha escolha. Qual será a sua?

Obs.: Com certeza este tópico continuará......

Pintura: Nicolas Roerich - Book of Wisdom




segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O que é cura?


Quando iniciei a faculdade de Psicologia, acreditava que poderia ajudar todas as pessoas que encontrasse. Acreditava que todos deveriam submeter-se à psicoterapia para que fossem "ajudados". Acreditava que minha família, meus amigos, meu marido, meus vizinhos (até meus cachorros!).... todos precisavam de alguém para curá-los. Eu queria curar, ajudar....
Bem... longo foi o caminho e ainda longo é....
Longo está sendo esse incrível aprendizado sobre o Caminho da CURA. Ainda estou aprendendo, ainda estou sendo submetida à ele e acredito que por muitos e muitos anos (e quem sabe vidas) estarei neste percurso.
Fácil? Bem.... depende. Por que depende? Depende da primeira lição (que ainda não aprendi por completo!): desapergar-se de expectativas. DESAPEGAR-SE, DESAPEGO. Difícil, muito difícil pensar em desapego.....
Faça assim... falarei sobre o apego/desapego em outro post. Farei isso com todo carinho, pois gostaria que antes você pensasse nessa palavra. O que ela te faz pensar? Sentir? Lembrar? Fique com isso para você, guarde os pensamentos, sentimentos e lembranças que vierem e depois falaremos sobre isso. Se quiser, pode comentar algo no Blog para pensarmos juntos (as).
Voltamos à Cura.....
Falar sobre Cura é algo extremamente complexo e eu não seria capaz de abarcar toda sua extensão. Entretanto, acho que posso compartilhar algo que estou aprendendo de forma muito intensa. A cura não é simplesmente o restabelecimento da saúde física e também não é o alívio de sintomas emocionais e mentais que hoje vemos em tão larga escala: remédio para depressão, estresse, síndromes mil..... É algo muito mais profundo.....mais intenso. É algo em que somente com Amor, Desapego (!), Vontade, Flexibilidade e Silêncio poderemos alcançar. É muito mais um Caminho, do que um ato, é muito mais uma Entrega do que uma espera.
Você deve estar se perguntando: mas o que é a Cura, afinal? Esse Blog é sobre isso, certo? E eu te respondo: em partes, pois a cura, é consequência de um caminho - do Seu caminho - por isso ele recebeu o nome de Espaço Curar-se e não espaço da cura.
O intuito do Blog é refletir sobre a cura, mas também sobre nossos caminhos, nossas paradas durante o percurso e o que estamos fazendo neste e com este caminho, para onde acreditamos que estamos indo... enfim..... tudo o que diz respeito a nós como Seres com plenas possibilidades de Curar a nós mesmos.
Ainda acredito que posso ajudar as pessoas, mas antes, preciso estar aberta para conhecer o meu caminho, com suas curvas, descidas, subidas e paradas únicas! Como posso ser uma Curadora se não conheço meu próprio caminho, minhas próprias possibilidades e potencialidades, minhas fraquezas e meus medos? Como serei um manancial se não me abro ao inesperado? Como posso oferecer um mapa se nem mesmo eu o tenho?
Ainda acredito que minha família, meus amigos, marido, vizinhos necessitam de cura, mas a diferença de quando inicie o curso de Psicologia para hoje, é que tenho absoluta certeza que não serei eu que a entregarei à eles. Posso estar ali, bem ao lado, segurando as mãos, sendo um ouvido, um ombro e oferecendo tudo que Eu Sou para que Eles mesmos possam encontrar seu próprio caminho e, desta forma, a sua própria Cura.
Seja Bem-Vindo, Curador de Si!